quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Inovação e confiança

Um amigo fazendo MBA me trouxe artigos do Clemente Nobrega[1] que versavam sobre 'inovação'. Seu ponto de vista, no mínimo insólito, motivou-nos uma discussão sobre o assunto. 

Como seu trabalho na pós era fazer uma resenha crítica acerca dos textos do autor, enviou-me, um dia após nossa conversa, sua brilhante conclusão.
Mas eu, afetado a emitir opiniões, tratei também de formalizar a minha. 

Vide abaixo os links (na sequência) para os textos do Nobrega. Em seguida, minha resenha.

Inovação, na presumida acepção da palavra nos textos, seria basicamente uma quebra ou mudança do “paradigma” negocial, que incluiria concepção, desenvolvimento, gestão e resultaria necessariamente na comercialização de novos (ou melhorados) produtos e/ou implementação de novos (ou melhorados) processos num contexto temporal bem definido.
Adendo: entenda-se ‘processos’ aqui numa extensão ampla que abrangeria processos de produção e/ou logística de bens ou serviços, técnicas, equipamentos ou software, métodos organizacionais de práticas de negócio, organização do trabalho e/ou relações externas e finalmente, métodos de marketing.
O conceito de inovação seria, portanto, usado no contexto de idéias e invenções, assim como sua consequente exploração econômica relacionada, sendo a inovação a invenção (física ou de novos processos) que chegaria ao mercado.

Evidente que o conceito vai além disso, não preso tão somente às novas tecnologias ou processos orientados a um mercado consumidor num determinado momento, onde aliás, nós sim, inevitavelmente presos em maior ou menor grau - como demonstrou o autor com algumas de suas estatísticas ao longo dos textos - ao trinômio reciprocidade-justiça-confiança.
Eu diria, todavia, que o trinômio é sim a base ética/moral/legal do liberalismo/capitalismo e economia de mercado, indiferente ao nível de inovação de um país, portanto. Todavia, inovações não são exclusividade de regimes capitalistas. 

Na antiga União Soviética, por exemplo, a despeito do grau de reciprocidade-justiça-confiança que por ventura pudesse ter sido medido num regime totalitário socialista - não cabe aqui alongar tal discussão que terminaria por corromper o objeto do artigo -, inovações na astronáutica (que o diga Gagarin) levaram o homem pela primeira vez ao espaço. E a terra era azul. 
Mas a corrida espacial com os US fora deflagrada em 1957, após o lançamento do primeiro satélite artificial da URSS, o Sputnik. Ora, confiança nada teve a ver com aquilo. Na verdade, tudo começara anos antes, após a segunda guerra mundial quando cientistas de foguetes alemães do pedigree de um Von Braun - posteriormente responsável pelo foguete Saturno V que levaria a Apolo 11 ao solo lunar - quase fizeram Hitler vencer a guerra com inovações bélicas como as bombas voadoras V2, que arrasaram a Inglaterra em 1944. 
Na partilha do butim, URSS e US levaram os engenheiros que trabalharam no desenvolvimento da V2 (tendo os US levado a melhor), e esses engenheiros foram a propulsão inovadora dos programas espacias dos respectivos países, se me permitem o trocadilho. O resto foi política/economia e o alvorecer da competição entre as duas potências/ideologias que culminaria com a guerra fria.

De Hitler e sua megalomania napoleônica globalista a Stálin/Khrushchev e Eisenhower/Kennedy, confiança teve “muito pouco” a ver com a inovação iniciada com a corrida espacial. 

No campo teórico, a equação de Dirac inovou a Física ao substituir a equação de Klein-Gordon (uma equação de segunda ordem nas derivadas temporais e espaciais) proposta para descrição de partículas elementares de spin-½, como o elétron, que apresentara severos problemas na definição de densidade de probabilidade. A equação de Dirac, sendo uma equação de primeira ordem, eliminou este tipo de inconveniente. Além disso, a equação introduziu teoricamente o conceito de antipartícula, confirmado experimentalmente pela descoberta em 1932 do pósitron, e mostrou também que o spin poderia ser deduzido facilmente da equação, ao invés de postulado. 

Indo mais longe, Marx revolucionou o pensamento humano com seu conceito de práxis revolucionária, Materialismo Histórico e Materialismo Dialético, mais-valia... culminados na Revolução Russa de 1917 e em tantas outras, seguidas depois. Se boas ou ruins, de cima de seus quase 100 milhões de cadáveres espalhados pela Rússia, Ucrânia, China, Camboja e mais... todos deitados pelo caminho, o leitor que decida. Novamente, confiança parece-me ter tido nada a ver com isso.

Portanto, o Nobrega parece partir de uma tese pre-concebida, buscar as hipóteses que a alimente e finalmente parte para a derradeira demonstração. Porém, ambas, hipóteses e demonstração, at that point, já contaminadas demais pelo processo de silogismo premeditado.

Eu cá, inconsequentemente, arrisco um diagnóstico diferente, que embora mais simples e óbvio, soa mais franco: inovação é o resultado da necessidade/desejo/demanda + criatividade e/ou genialidade direta ou indiretamente fomentada por educação/cultura + competitividade e/ou estímulo/investimento, representados aqui por pesos diferentes, ponderados, portanto, diferentemente na equação dependendo do ambiente sócio-cultural, político e da infra-estrutura disponível em cada país.

E embora na Dinamarca já exista uma rede all over the country para garantir o uso do carro elétrico sem a limitação da autonomia de 200 Km (foram criadas facilities para reposição das baterias e os carros estão equipados com alarme e GPS apontando quando e o lugar mais próximo para a troca, efetuada por robôs em menos de 2 min, btw), essa “inovação” seria fiasco certo no Brasil. Com ou sem confiança mútua e as regras da lei, diga-se de passagem!!!

Portanto, o “mantra” entoado pelo Nobrega parece-me mais aplicável ao mundo dos treinamentos corporativos, e embora a disseminação ideológica da idéia não seja de todo ruim - além de ser por si só inovação de um conceito na literatura negocial -, provavelmente não garantiria aumento de nosso nível de inovação... at all.

Se não é assim, por que diabos a Basiléia, na Suiça - onde definitivamente o trinômio citado é mister - apresentou-nos apenas Federer - um acima da média – como única inovação nos últimos anos?
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[1] Clemente Nobrega, pesquisador de gestão e estratégia, autor de Empresas de Sucesso, Pessoas Infelizes?, entre outros livros, e do site clementenobrega.com.br

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