sábado, 5 de fevereiro de 2011

Nova Ordem I

Demorei 20 anos para conseguir comprar (e ler) o último livro da tetralogia 'Os Guaianãs', do Benito Barreto: 'Cafaia'.
Em meu último aniversário ganhei 'Criação Imperfeita', do Marcelo Gleiser. Já vinha lendo os 'Ensaios Céticos' do Russell quando resolvi também comprar 'Lulismo' do Rudá Ricci e '1808' do Laurentino Gomes.
Havia terminado então a leitura das 'Reflexões sobre um Século Esquecido...', do Judt.

O resultado foi um caldeirão contraditório.
Ao mesmo tempo em que me emocionava com o desfecho da epopéia sertaneja do Guaianã, embora hoje anacronica, depois de dissecadas todas as revoluções comunistas, seus Kmers Vermelhos, Expurgos e Holodomores, totalitarismos grotescos analisados por Judt, deparava-me com a verdade científica da fisica quantica e a origem da matéria. De nossa solidão num universo frio e em expansão acelerada e da raridade no cosmo das condições necessárias à sopa pré-biótica para produzir organismos vivos de alta complexidade molecular como nós, solitários no planeta Terra, pulava para a trajetória da corte de D. João no Brasil do começo do século XIX.
Empenhava-me também em acreditar no academicismo sociológico de dados e estatísticas e suposições de causa e efeito, que imprimem um arcabouço teórico a um fenômeno carismático suportado pela conjuntura mundial - embora pra mim uma mera lula a mais num oceano pragmático/ideológico de fauna diversa - tentando esquecer da (suposta) frase atribuída ao sociólogo FHC (ele nega), então governo: "Esqueçam tudo que eu escrevi".
As vezes trazido de volta ao racionalismo cético do velho lorde, a única saida para a raça humana, dizia ele, sempre pacifista, embora fosse impossível não me emocionar com a vitória heróica da fictícia guerra de Benito, em contraponto com a realidade nua e crua de uma Vera Magalhães. E novamente chocado com nossa história nefasta de peculato, corrupção, cujo rastro na índole nacional parece ser indelével, nos colocando a mil anos luz da utopia Darcyniana de Brasil.

Sinto-me então abatido por um niilismo fantástico.
Sei que chegamos até aqui. Agora gostaria de muito, muito mais do que o que vejo nos noticiários.

Passei por Judt e Russell para me embrenhar por Gleiser e Laurentino e entender melhor a história de nosso caminho. Terminei num mar de brejais onde seres como os que hoje habitam a política nacional nos compelem de volta ao papel de coadjuvantes sociais, sempre.
De que adiantam então as análises sociológicas pasteurizadas, sem alma, circunscritas ao academicismo de universidades? Nenhum ideal nesse nosso terreno árido.

Desolado repito o Guaianã/Barreto:
"...com o Cafaia se alistassem e o seguissem quantos ali ainda achavam possível refazer a vida e nisso acreditassem; que com o João do Vau ficassem os homens de fé, que buscam a Deus e temem o Diabo; e viessem comigo os que já não crêem em nada.
Montei o meu cavalo. Em verdade não querendo mais ninguém comigo, ou só talvez o Maximino. Talvez.
Mas quando me voltei, já à saida do arraial, pesado era o tropel e bem alta, infelizmente, a poeira que na estrada levantavam atrás de mim."[1]

E o risco do abismo...
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[1] BARRETO, Benito. Cafaia, o Diabo do Povo. Belo Horizonte: Interlivros, 1975.

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